sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Entrevista sobre Patrimônio Histórico concedida ao repórter Messias Monteiro Júnior (in memoriam)

Reproduzo o texto, copiado na íntegra da gravação original, da entrevista que concedi ao meu querido amigo Manoel Messias da Cruz Monteiro Júnior (+22.12.2009), no Programa Realidade 106, da Fundação Educadora de Comunicação (Educadora FM), que foi ao ar em 1º de agosto de 2009. Messias Monteiro Júnior era repórter do Programa Realidade 106, fazia trabalhos para o SBT Bragança,além de ser meu companheiro no LEO Clube de Bragança e meu aluno na EEEFM Luiz Paulino Mártires. Nos deixou uma grande saudade. E como hoje completa um mês do seu falecimento, coloco o texto aqui como minha homenagem a um jovem talento bragantino que se foi, mas que deixou marcas positivas de sua breve trajetória entre nós.
Entrevistado: Prof. Dário Benedito Rodrigues, historiador

Repórter: Manoel Messias da Cruz Monteiro Júnior

Emissora: Fundação Educadora de Comunicação (Educadora FM)

Programa: Realidade 106

Data em que foi ao ar: 1º de agosto de 2009

Parte 1

Messias: Estou de volta no Programa Realidade 106 abordando os assuntos de interesse da comunidade em geral. Nos últimos anos a população bragantina tem assistido a perda de um pouco de sua memória. Essa perda se dá pelas condições em que se encontram diversos casarões históricos que estão simplesmente “caindo aos pedaços”, sem algum reparo e sofrendo as ações da natureza e a urbanização de Bragança. Os casarões mais conhecidos, como a Escola Monsenhor Mâncio, a antiga Casa da Cultura e até mesmo o Palacete Augusto Corrêa, onde costumava a funcionar a Prefeitura Municipal até que o teto ameaçou desabar. Esses são alguns dos casarões históricos que se encontram interditado ou em situação de abandono. Com essa situação, a cidade de Bragança não perde só um patrimônio material, mas também um patrimônio cultural. E pra debater sobre esse assunto, aqui no Programa Realidade 106, está conosco o Professor Dário Benedito, historiador bragantino, mestre em História Social. Boa tarde, professor Dário, conta aqui pra nós ouvintes qual a perda que Bragança está tendo com a dilapidação do patrimônio histórico e cultural? Boa tarde.

Prof. Dário: Boa tarde Messias. Boa tarde a todos os ouvintes da Fundação Educadora. É uma grande satisfação sempre poder participar. Primeiramente, o patrimônio histórico, arquitetônico e cultural, em geral, constitui uma face, uma medida do passado. É um fator de determinância para que a gente possa ter na nossa sociedade hoje as reminiscências do passado, as lembranças. O acesso ao passado, à memória coletiva, é dado através de várias fontes. O patrimônio é uma fonte. É evidente que de alguns anos para cá, a própria consciência da urbanidade foi começando a modificar isso daí. Parece que aquilo que é antigo tinha que ser destruído e Bragança passou por uma dilapidação muito grande, muito mais anteriormente, desde a década de 40 a 60 foram começando a destruir pra modificar muita coisa. O estilo arquitetônico modificou-se. E agora nós estamos assistindo assim a um abandono de certos patrimônios históricos. Nós podemos citar vários, mas eu queria fazer referências a alguns prédios que observo pessoalmente. Primeiro a Escola Mâncio Ribeiro. A Escola Mâncio Ribeiro é um palacete, a única escola dentro de um palacete. Feita pra ser o Grupo Escolar Eurico Freitas Vale, Dr. Eurico Freitas Vale, em 1929, é palacete muito bonito que está sendo todo dilapidado. A propriedade do prédio é da SEDUC. E a reforma do prédio ficava a critério da SECULT. Até agora não apareceu. Objetivo, planejamento, arquitetura, todo mês vem fazer um levantamento aí. Ninguém tomou a frente desse processo. Está desde 2006 o prédio em total estado de calamidade. Pra mim, o prédio já devia ter sido, é, reformado, bem iniciada sua reforma. Teve todo o madeirame retirado de acapú e pau-amarelo que não existe na natureza. Eu estabeleci a denúncia junto ao Ministério Público e às Polícias, né. Uma referência especial à Polícia Militar que sempre nos ajuda nessa questão patrimonial, o Major Vieira sabe bem disso. E a outra casa que eu queria fazer referência, dentre outras, é a casa da Residência Raymundo Nazeazendo Ferreira. Fica bem em frente ao Mâncio. É uma residência de um dos prefeitos e proprietários locais da passagem do século XIX pro XX com maior preponderância em Bragança, de muita importância. Uma empresa adquiriu esse imóvel já sabendo do processo de tombamento do imóvel e permitiu que ela, está sendo toda dilapidada, está sendo permitido a dilapidação do prédio, né. A Polícia já esteve lá. Foi também retirado por ordem do atual proprietário, foi retirado todo o madeirame, que segundo ele, segundo porque ninguém viu, segundo a versão dele, o madeirame está guardado. O prédio, é, foi também retirado todo o ajardinamento, que era próprio de um local como aquele, era um terreno bosque ali, com algumas árvores frutíferas, etc., foi todo tirado e a casa está passando por um processo de dilapidação externa porque vândalos e outras pessoas vão lá e tiram o madeirame, etc., e nós já temos poucos resquícios de prédios daquela imponência. O terceiro prédio que tá com problemas sérios e aqui a Administração Municipal deve olhar com mais cuidado e com mais cautela e com um sentimento de recuperação, é a Casa da Cultura, que era propriedade do José Paulino dos Santos Mártires. Aquela casa dali foi transformada em sede de vários eventos culturais, tinha um salão nobre ali, ela serviu como Biblioteca Pública “De Castro e Souza”, tem o Salão de Música “Vitaliano Vari”. Então, aquele prédio no centro da cidade assusta o visitante. É um prédio que está mal assombrado, também fazendo parte do patrimônio público, que está sendo digamos assim esquecido. Nós temos algumas outras referências pra fazer e acho que a maior parte do patrimônio de Bragança se não for, se não for vista com carinho, eu acho que primeiramente, primeiramente pela própria população que acha que o que é antigo não serve, o que eu falei logo no início, e depois por quem tem a obrigação de salvaguardá-los, os proprietários.

Messias: Ok, professor Dário, daqui a pouco a gente volta no Programa Realidade 106 conversando ainda sobre as condições que se encontram muitos casarões históricos aqui na cidade de Bragança. Segue Luciana, segue Padre Nelson com a programação do Programa Realidade 106. Daqui a pouquinho eu volto com o Professor Dário Benedito, historiador bragantino, falando sobre os casarões históricos da cidade.

Parte 2

Messias: Estou de volta no Programa Realidade 106 ainda conversando com professor Dário Benedito, historiador bragantino, sobre esse assunto de extrema importância, aqui na cidade de Bragança, que são as condições dos casarões históricos. Professor Dário, nos últimos anos, temos assistido uma reforma desses casarões históricos aqui na cidade de Bragança e o senhor como historiador, qual a sua opinião sobre esses reformas que foram feitas e não tiveram o objetivo atingido pois hoje alguns casarões ainda encontram-se em estado de calamidade?

Prof. Dário: Primeiro eu queria me reportar a essa administração. Nós fizemos dois tombamentos. Um em outubro de 2006. Nunca teve nenhum tombamento. Nós tombamos treze imóveis em dois decretos de outubro de 2006 e janeiro de 2008. Estudamos os prédios, temos uma cópia de estudos sobre os prédios, sobre estilos, mas, vamos fazer por exemplo, alguns exemplos. A Casa das Treze Janelas foi reformada, era uma residência oficial de prefeitos, e as paredes foram divididas com forro de PVC, na gestão retrasada, né, a gestão desenvolvimentista. A Prefeitura Municipal de Bragança que é um prédio, assim, talvez um dos mais imponentes foi reformada, foi dada uma maquiagem na Prefeitura. Teve também as suas divisórias todas feitas com forro de PVC. Tá lá pra todo mundo ver, não tô exagerando. A gestão que era "da bragantinidade". Depois nós tivemos um problema muito grave na Casa da Cultura, foi só feita uma maquiagem. O teto ele, ele veio a desabar. A estrutura toda que suporta o telhado, ela já está embaixo. A Prefeitura teve um alerta do Corpo de Bombeiros pra que acontecesse a retirada de tudo o que era da Prefeitura. Nós fizemos tudo o que foi possível. Mas, de estudar, pelo menos. Eu não tenho poder, nem é minha função executar obras, mas eu tenho apenas a questão de estudo e de definição. O alerta sobre isso foi feito.Messias: Um estudo adequado para a reforma dos casarões foi feito, agora na obra, não tivemos lá uma realização completa?

Prof. Dário: Não. Não tivemos. A necessidade de ter na Prefeitura uma Equipe Técnica já tinha sido alertado os gestores anteriores. Há muito tempo eu mesmo, pessoalmente o fiz, aos gestores passados e ao atual gestor, que tem uma Equipe Técnica uma pouco mais eclética. Nós temos dois historiadores na SEPLAN, temos arquitetos formados em Patrimônio Histórico. Mas nós precisamos de políticos que deixem de fazer obras patrimonialistas. Nós precisamos de pessoas que deixem de ficar pensando em mudar nome das coisas de Bragança, de ficar pensando em mudar em os símbolos históricos de Bragança. E cuidar do que é realmente um símbolo histórico. Tirar a História de Bragança do submundo. Ou seja, tirar a História de Bragança do esquecimento e deixá-la falar. Porque a gente não pode deixar pros nossos sucessores, pros nossos predecessores uma cidade sem memória, uma cidade sem passado. Então, tem tanta coisa pra se preocupar do que ficar se preocupando se o nome do lugar é “x” ou “y”, de ter que mudar data do símbolo de Bragança, se preocupando com a questão patrimonialista, a questão “homenagear pessoas”. Essa questão pra mim é extremamente falha. Então tem que se preocupar com aquilo que tem que realmente olhar com cuidado. Olhar o patrimônio histórico, arquitetônico, material é também fazer um grande movimento. Eu me disponho sempre a ajudar. Estou disposto sempre a ajudar, mas eu não posso me resguardar de fazer essas observações. Nós temos um grupo de historiadores que pensam sobre isso, pessoas gradas, pessoas que se preocupam um pouco com a memória. Nós temos leis tão avançadas, como o Plano Diretor. É só colocar em prática isso aí. Então, eu acho que tá faltando cuidado, um trabalho efetivo. Estão fazendo muita festa em Bragança e tão cuidando muito pouco da questão imobiliária, patrimonial. Todo mundo sabe o que eu penso sobre isso. Os gestores sabem o que eu penso sobre isso. Eu já disse pessoalmente isso. Eu também sei que há algumas impossibilidades, mas também acho que há muito esforço em coisas que tem todo ano e pouco esforço em coisas que tem para sempre. Então acho que nós temos que ver o que é que de Bragança é melhor. E tirar disso uma lição pra todos nós. Especialmente pra mim. Pra aprendermos a trabalhar em conjunto, pensar as coisas em conjunto e pensar um pouco a memória de Bragança. O nosso objetivo com isso é alertar. Não é criticar, não é falar mal, ninguém tá fazendo isso. Alertar sobre um problema que todo mundo tá vendo e está a olhos nus a dilapidação dos nossos prédios históricos. É isso aí. Eu agradeço à Educadora e também ao Padre Nelson por estar colocando essa questão aí em tela, em debate. Eu espero que muitas outras pessoas possam contribuir, né, não somente a minha pessoa, mas outros profissionais grados contribuírem com a questão. É tão fácil cuidar da memória e do passado. Vamos procurar olhar com bons olhos isso aí.

Messias: Ok Prof. Dário. Muito obrigado pela sua participação no Programa Realidade 106. Professor Dário Benedito, historiador bragantino, falando um pouco aqui sobre a situação em que se encontram os casarões históricos da cidade de Bragança. Daqui a pouco eu volto no Programa Realidade 106, o programa que escuta você.

2 comentários:

  1. Professor, hoje bateu uma saudade tão grande do Messias e resolvi procurar alguma coisa que amenizasse essa saudade. As gravaçoes que ainda guardo de nós dois, um tanto antigas, ainda me doem escutar, mas que presente e homenagem maravilhosa que o senhor fez... Linda!
    Abraços, Lunnara Teixeira.

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  2. Por favor, não entendi bem o que você falou sobre a escola Eurico de freitas Valle. Ela existe, tem esse nome ou mudou? pergunto porque estou fazendo pesquisa sobre dr Eurico Valle, governador do Pará em 1929. Qualquer informação será muito util para mim. obrigado

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