quinta-feira, 26 de abril de 2012
Marujada de São Benedito de Bragança recebe prêmio da CNBB em 2012
quarta-feira, 25 de abril de 2012
Ainda repercute a derrota de Bragança na Dança da Galera no domingo, dia 22 de abril
domingo, 22 de abril de 2012
Bragança é o Norte, a Amazônia e o Pará, hoje, na Dança da Galera
Queridos/as amigos/as,
Nós de Bragança/PA, no Norte, na Amazônia, fomos selecionados entre seis municípios brasileiros para concorrer ao prêmio de R$ 100.000 num novo quadro do Programa Domingão do Faustão da Rede Globo de Televisão. Será uma oportunidade ímpar de divulgação da Amazônia e do Norte, de toda a força da região, vencendo aos poucos os grandes desafios da integração brasileira e de ampliação da visão do Brasil sobre esse espaço amazônico, ainda tão desconhecido por tantos de nós, inclusive da própria Região Norte.
No final de março e início de abril, a cidade de Bragança
se mobilizou para alcançar um número expressivo de dançarinos a fim de executar
uma coreografia massiva, coordenada pela renomada coreógrafa brasileira Renata
Vieitas, que já dirigiu diversos espetáculos no Brasil (como a abertura do
Panamericano do Rio em 2007) e no mundo.
Foram mobilizados mais de 1.000 participantes e no Domingo de Páscoa, dia 08 de abril, realizamos a coreografia da Dança da Galera, com um ritmo envolvente da música do Pará. Um grande espetáculo foi preparado e a união do povo bragantino e das cidades circunvizinhas a Bragança demonstrou não somente o interesse em participar e vencer a disputa tão harmoniosa, mas de unir as pessoas pelos laços da amizade e do objetivo social.
Vários aspectos e peculiaridades da cultura, história e características do povo de Bragança serão mostrados no quadro, com especial atenção à participação nos bastidores, mesmo de forma humilde, como a minha, cujos textos estão no site do Faustão e de várias outras personalidades tão importantes, que compuseram as personagens dos quadros. Vários bragantinos também participaram e demonstraram seu senso de comprometimento com a causa e com os nobres objetivos do quadro e da mobilização junto à comunidade bragantina.
O prêmio será destinado em sua totalidade às obras educacionais da Pastoral da Criança, fundada pela Dra. Zilda Arns Neumann, que inclusive esteve em Bragança em visita à sua pastoral e participou de eventos naquela oportunidade. São cerca de 32.000 pessoas atendidas pelos voluntários da Pastoral da Criança da Diocese de Bragança/PA e que contam com esse recurso para continuar e ampliar suas ações educacionais.
Esse prêmio também será um grande presente antecipado para nossa cidade, prestes a completar 400 anos de colonização europeia em julho de 2013 e do qual somos todos parceiros para comemorar com garbo e elegância esse evento.
A divulgação do quadro e da coreografia de Bragança será nesse domingo, dia 22 de abril de 2012, a partir das 18h no Domingão do Faustão (TV Globo) e a votação incluirá os seguintes métodos:
1) Votação via SMS (telefone celular);
2) Votação no site do Domingão do Faustão (www.globo.com/faustão);
3) Votação por telefone fixo;
4) Votação do auditório do programa do Faustão.
Nesse sentido, estou fazendo uso desse espaço para solicitar a todos a colaboração para votarem em Bragança/PA e ajudarem a tantos dos nossos irmãos mais necessitados e atendidos nos trabalhos da Pastoral da Criança, em nome de todos os mais de 1.000 participantes que assim como eu dançaram e fizeram bonito em prol de uma nobre causa da saudosa Zilda Arns.
Esse pedido se soma ao apelo Leonístico e LEOístico de Bragança, que contou com alguns desses participantes entre aqueles que realizaram a coreografia e estão ajudando na mobilização por Bragança, junto a todas as instâncias Leonísticas e LEOísticas do Brasil.
Agradecemos a todos/as os/as amigos/as pela atenção e esperamos que hoje, dia 22 de abril de 2012, a partir das 18h, a sua audiência, seu carinho e o seu voto por Bragança/PA, terra que Deus nos deu como chão, o melhor de nós, o ser bragantino. Em nome de tudo isso, agradecemos por tudo, especialmente pela demonstração de companheirismo e de amor à Bragança. Compartilhem conosco desse sonho e dessa vitória, se Deus quiser!
Um abraço fraterno e caloroso dessas bandas do Caeté,
Prof. Dário Benedito Rodrigues, historiador
sábado, 21 de abril de 2012
Documentário "Marujada: Festa de Negros", produzido em Bragança, pela TV Nazaré recebeu Prêmio Clara de Assis da CNBB 2012
Prêmio Clara de Assis: destinado as reportagens e documentário televisivos.
sábado, 14 de abril de 2012
Esmolação de São Benedito de 2012 começa
O ritual de Esmolação, parte componente do chamado Ciclo de São Benedito (Festividade e Marujada) e um dos rituais mais antigos no processo histórico de constituição da devoção beneditina em Bragança, se inicia em meados do mês abril com a saída das Comitivas para o interior do município. Consiste na peregrinação de três imagens de São Benedito, que partem em comitiva em visitação a casa de fieis do meio rural. Essas visitas são feitas a pedido do próprio devoto que deseja pagar uma promessa por graças alcançadas. Além de receber a comitiva, o promesseiro pode oferecer-lhe donativos. O deslocamento das comitivas é feito principalmente a pé, seguindo roteiro determinado.
Antes da partida, há uma cerimônia religiosa na Igreja de São Benedito, na qual o Vigário da Paróquia de Nossa Senhora do Rosário, catedral diocesana de Bragança, faz uma leitura e das recomendações do Compromisso da Esmolação, que é depois assinado e confirmado por todos os membros das comitivas. Em seguida, esses esmoleiros e o padre dirigem-se para o altar-mor para a benção das três imagens. Terminadas as cerimônias, as comitivas partem em cortejo pelas ruas, a pé, seguindo para as casas onde realizaram os rituais de canto, reza e folia.
Três Comitivas trabalham na Esmolação, sendo a Comitiva de São Benedito dos Campos, que percorre toda a região dos campos naturais de Bragança e Tracuateua; a Comitiva de São Benedito da Colônia, que percorre a região das colônias; e a Comitiva de São Benedito das Praias, que percorre as regiões litorâneas bragantinas, praias vizinhas, comunidades do litoral atlântico e da bacia hidrográfica do Caeté.
Cada Comitiva é composta por cerca de doze esmoleiros, que obedecem a uma hierarquia de cargos e funções. Estas funções podem ser trocadas por ordem do encarregado que coordena os trabalhos do grupo. O grupo é formado apenas por homens adultos, que passam até oito meses longe de suas famílias, movidos pelo pagamento de promessa e pela devoção a São Benedito. A andança com a imagem do Santo é marcada por duas etapas distintas que passam a ser o cotidiano dos esmoleiros: o deslocamento de uma casa para outra, e a permanência do Santo e sua comitiva.
A chegada do Santo é sempre um motivo de festa na casa do promesseiro que lhe dará o pernoite. Ela é anunciada pelos instrumentos da comissão e saudada com foguetes, que ocorre geralmente no final da tarde. É usual neste momento os esmoleiros cantarem folias. São cinco as folias obrigatórias executadas todos os dias: folia da Chegada (cantada quando a comitiva chega para o pernoite), folia da Ave Maria (cantada às 18 horas), folia de Agradecimento à mesa (cantada após o jantar), folia da Alvorada (cantada às 05 horas da manhã) e folia da Despedida (cantada na saída da casa do promesseiro).
Essas folias são entoadas em três vozes (voz principal, contra-alto e baixo), segundo denominação utilizada pelos cantadores. O ritmo assemelha-se à Roda, música dançada pelas marujas no barracão ao iniciar as festividades e os rituais da dança.
Uma característica peculiar do condutor (a) do Santo, que geralmente e o dono ou a dona da casa, é colocação de uma toalha branca no ombro, para evitar o contato do corpo com a imagem. O cortejo de entrega da Imagem é feita na seguinte ordem: na frente vão bandeireiros, seguidos pela promesseira acompanhada do encarregado e por últimos os foliões.
O ritual mais importante da Esmolação é a Ladainha, rezada numa espécie de latim arcaico aprendido de geração em geração (chamado por alguns teóricos de latim caboclo, devido à predominância desse idioma nas celebrações religiosas dos séculos XVIII e XIX). No passado a ladainha era toda em latim, por ser a língua oficial da Igreja Católica Apostólica Romana, passava a ter poderes extraordinários para evocação ou chamamento do sagrado. A forma deste latim foi se modificando com o passar do tempo e hoje já contém muitas palavras em língua portuguesa. O ritual da reza se caracteriza por ser predominantemente noturno e por ser um dos pontos altos da Esmolação. Todos esperam ansiosos por este momento, pois a presença do Santo e sua comissão quebram a rotina da comunidade e da casa, sendo um momento de encontro e renovação da fé.
Ao cair da noite, o som dos tambores convoca os devotos para participar da reza. A sala principal da casa do promesseiro, onde é montado o altar do Santo, fica pequena para a louvação ao Santo Preto. Os esmoleiros dão início ao ritual, fazendo cantorias em louvação a São Benedito. Após a louvação, o encarregado e os foliões vestem opas (espécie de “beca”, ou blusa, usada durante a ladainha e quando a Imagem chega à casa do promesseiro) e inicia-se a ladainha. Encerra-se o ritual com o beijo na fita do Santo, a começar pelo encarregado, que se ajoelha diante da imagem e com a mão direita segura a fita que está ligada ao Santo e a beija, benzendo-se em seguida. Estes gestos são repetidos por todos os presentes.
É importante ressaltar que este ritual repete-se em todos os momentos de aproximação do devoto à imagem de São Benedito, este gesto traduz o respeito e obediência, como se o devoto estivesse beijando a mão do próprio Santo.
No serviço de visitas aos devotos, os esmoleiros levam em média 15 dias em cada comunidade. Além de recolher os donativos das promessas, o ritual da visitação tem por finalidade o registro dos relatos dos milagres para fomentar a força do catolicismo popular com a reza da ladainha. É obrigação do promesseiro responsável pela acolhida da comissão oferecer abrigo para todos e alimentação durante a permanência do Santo na casa.
A partida da comitiva é realizada com muita emoção. A dona ou dono da casa leva o Santo ao seu novo abrigo, que pode ser no mesmo povoado ou em local distante. O encarregado decide se a partida será feita pela manhã ou à tarde. Os grupos percorrem localidades e municípios até mesmo de outros estados, como o Maranhão, por exemplo, onde existe uma grande devoção a São Benedito.
Em se tratando das representações e imagens, cada comitiva leva uma imagem distinta, sendo que em duas delas não possuem o talho do Menino Jesus no colo de São Benedito. A imagem de São Benedito da Praia – a mais antiga, segundo tradição oral – aparenta ser maior que as demais.
Imagens: Acervo pessoal (Prof. Dário Benedito Rodrigues), 2011.
Procura-se um amigo, por Vinícius de Morais

Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir.
Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto, dos ventos e das canções da brisa.
Deve ter amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.
Deve amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo.
Deve guardar segredo sem se sacrificar.
Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de segunda mão.
Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados.
Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas não deve ser vulgar.
Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa.
Tem que ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo.
Deve sentir pena das pessoas tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.
Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos.
Que se comova, quando chamado de amigo.
Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância.
Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade.
Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se deitar no capim.
Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo.
Precisa-se de um amigo para se parar de chorar.
Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas.
Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.
sábado, 7 de abril de 2012
Lamento da Virgem, em O Poema do Homem-Deus (de Maria Valtorta)
LAMENTO DA VIRGEM[i], de O Poema do Homem-Deus[ii]
Maria Valtorta[iii]
“Jesus! Jesus! Onde estas? Me ouves ainda? Ouves tua pobre Mãe que grita, agora, o teu Nome santo e bendito, após tê-lo guardado no coração por tantas horas? O teu Nome santo, que foi o meu amor, o amor dos meus lábios, que experimentaram sabor de mel ao pronunciar que bebem o amargor que ficou em teus lábios. O amargo da atroz mistura.. o teu Nome, amor do meu coração que se enchia de alegria quando o pronunciava, assim como se dilatara para extravasar seu sangue e receber-te e recobrir-te de si mesmo, quando desceste a mim do Céu, tão pequenino, tão minúsculo, que terias conseguido pousar no cálice da hortelã selvática.
Tu, tão grande, Tu, o potente aniquilado num germe humano para a saúde do mundo. O teu Nome, dor do meu coração agora que te arrancaram aos afagos de tua Mãe, para jogar-te entre os braços dos algozes, que te torturaram até a morte. Tenho o coração despedaçado por causa deste Nome que tive que guardar dentro de mim por tantas horas e que mais aumentava o seu grito na proporção que mais aumentava a tua dor, até arrebentá-lo, como coisa amassada pelo pé de um gigante. Oh! Sim que a minha dor é gigante e me esmaga, me despedaça e não há nada que a possa aliviar. Para quem eu pronuncio o teu Nome? Nada responde ao meu grito. Ainda que eu gritasse, até despedaçar a pedra que fecha o teu sepulcro, Tu não ouvirias, porque estás morto. Não ouves mais a tua Mãe? Quantas vezes não te chamou, ó Filho, nestes trinta e quatro anos! [iv] Desde quando soube que deveria ser Mãe e que o meu pequenino se teria chamado ‘Jesus’! Tu não tinhas nascido e eu, acariciando o ventre, onde Tu crescias, sussurrava com carinho: ‘Jesus’, e me parecia que Tu te mexias para dizer-me: ‘Mamãe’. Eu te dava já uma voz, já a sonhava, a Tua voz. Ouvia-a antes que fosse. E quando a ouvi, tênue como a de um cordeirinho recém-nascido tremer na noite fria em que nasceste, eu conheci o abismo da alegria... e acreditei de ter conhecido o abismo da dor porque era o pranto da minha Criatura que tinha frio, que estava desagalhada, que chorava o seu primeiro pranto de Redentor e eu não tinha fogo nem berço e nem podia sofrer em teu lugar, ó Jesus. Não tinha que o seio para fogo e travesseiro e o meu amor para adorar-te, meu Filho Santo.
Pensava de ter experimentado o abismo de dor... Era tão somente o alvorecer daquela dor, era o princípio. Agora é meio dia. Agora é o extremo da dor. Este é o abismo, este que toco agora, após ter descido neste trinta e quatro anos, empurrada por tantas coisas e hoje prostrada no fundo horrendo da Tua Cruz.
Quando eras pequenino, eu te embalava, cantando: ‘Jesus! Jesus!’ qual harmonia mais santa e linda do que este Nome, que faz sorrir os anjos do Céu? Ele para mim era mais lindo que o canto, tão doce, dos anjos da noite do teu Natal. Enxergava nele o Céu, todo o Céu via através daquele Nome. E agora, ao dizê-lo a Ti que és morto e não me respondes, como se Tu nunca tivesse existido, eu vejo o Inferno. Eis: agora compreendo o que quer dizer ser danado. É não poder mais dizer: ‘Jesus!’ Horror! Horror! Horror!...
Quanto durará este Inferno para a Tua Mãe? Tu o disseste: ‘Depois de três dias reedificarei este Templo’. É o dia todo que estou repetindo estas Tuas palavras, para não cair morta, para estar pronta a te saudar quando da Tua volta, e servir-te ainda... Mas como poderei suportar que Tu permaneças morto por três dias? Três dias na morte, Tu, Tu, minha vida?
Mas como? Tu que sabes tudo porque és Sabedoria infinita, não conheces o espasmo de tua Mãe? Não to podes imaginar, recordando quanto te perdi em Jerusalém e Tu me viste romper a multidão que te rodeava, com o rosto de uma náufraga que toca a terra após tanta luta com as ondas e com a morte, com o rosto de uma que sai de uma tortura cansada, dessangrada, envelhecida, alquebrada? Mas naquela ocasião podia pensar que fosses unicamente perdido. Podia me iludir que era só assim. Hoje, não. Hoje, não. Sei com certeza que estás morto. Não é possível a ilusão. Eu te vi ser morto. Eis: também se a dor me desmemorasse, eis aqui o teu Sangue, sobre o meu véu, que me diz: ‘Está morto! Não há mais sangue! Este é o último, jorrado do seu Coração!’ Do seu Coração! Do coração do meu Menino. Do meu Filho! Do meu Jesus! Oh! Deus! Deus piedoso, não me faças recordar que lhe partiram o Coração...
Jesus, não posso ficar aqui sozinha, enquanto Tu estás sozinho lá. Eu que nunca amei as estradas do mundo e as multidões, e Tu bem o sabes, desde quando Tu deixaste Nazaré vim sempre mais ao teu encalço, para não viver longe de ti. Enfrentei curiosidades e escárnios; não enumero os cansaços porque eles se dissipavam ao encontrar-Te, para conseguir viver onde Tu estavas. E agora estou aqui sozinha. E Tu estás lá sozinho. Por que não me deixaram no teu sepulcro? Teria me sentado perto o teu gélido leito, segurando a tua mão nas minhas, para te fazer sentir que estava perto de ti... Não, para eu sentir que Tu estavas perto. Tu que não sentes mais nada. Estás morto!
Quantas vezes passeis às noites perto do teu berço, orando, amando, inebriando-me de Ti. Queres que eu te diga como dormias, as mãozinhas fechadas como dois botões de flor perto do rostozinho santo? Queres que eu te diga como sorrias sono e, lembrando-te certamente do leite da Mamãe, dormindo, fazias o festo de chupar? Queres que eu te diga quando te despertavas e abri os olhinhos e rias, vendo-me curvada sobre o teu rosto, e tendias as mãozinhas com alegria impaciente por ser carregado e com um gritozinho doce como um trilo de um toutinegra, reclamavas a tua comida? Oh! Como me sentia feliz quando te agarravas ao meu seio e sentia a tepidez lisa das tuas faces, as carícias das tuas mãozinhas sobre o meu seio!
Não sabias ficar sem a tua Mamãe. E agora estás sozinho! Perdoa-me, Filho, de ter-te deixado só. De não me ter rebelado pela primeira vez na minha vida e ter resolvido ficar lá; era o meu lugar. Ter-me-ia sentido menos desolada, se tivesse ficado perto do teu fúnebre leito, para te ajeitar as faixas como outrora e mudá-las... Também se Tu não tivesses tido a possibilidade de me sorrir e me falar, eu teria tido a impressão de possuir-te ainda pequenino. Teria te amparado sobre o coração, para não te fazer sentir o frio da pedra, a dureza do mármore. Não te segurei também hoje? O colo materno é sempre capaz de receber o Filho também se já é homem. O filho é sempre uma criança para a sua mãe, também se é descido de uma cruz, coberto de chagas e feridas.
Quantas! Quantas feridas! Quanta dor! Oh! O meu Jesus, o meu Jesus tão ferido! Ferido! Assim! E desta maneira morto! Não. Não. Senhor, não! Não pode ser verdade! Eu estou louca! Jesus, morto? Eu estou delirando, Jesus não pode morrer! Sofrer, sim. Morrer, não. Ele é a Vida! Ele é o Filho de Deus. É Deus. Deu não morre.
Não morre? E então por que se chamou de ‘Jesus’? Que quer dizer ‘Jesus’? Quer dizer... Oh! Quer dizer: ‘Salvador’! Morreu! Morreu, porque é o Salvador. Teve que salvar a todos, perdendo a Si mesmo... Não deliro, não. Não estou louca. Não. Se o fosse! Sofreria menos! Ele morreu. Eis o seu Sangue. Eis a sua coroa. Eis o três pregos: com estes, com estes, mo transfixaram!
Homens, olhar com que transfixastes a Deus, ao Filho meu! E vos devo perdoar. E vos devo amar. Porque Ele vos perdoou. Porque Ele me disse de voz amar! Fez-me vossa Mãe, Mãe dos assassinos da minha Criatura! Uma de suas últimas palavras, lutando contra o estertor da agonia... ‘Mãe, eis o teu filho... os teus filhos’. Também se eu não fosse Aquela que obedece, teria que obedecer hoje, porque é a ordem de um moribundo.
Eis. Eis. Jesus, eu perdoo. Eu os amo. Ah! Mas se despedaça o coração neste perdão, neste amor! Me ouves, que os perdoo e que os amo? Oro por eles. Eis: oro por eles... Fecho os olhos, para não ver estes objetos de tua tortura, para os poder perdoar, para os poder amar, para poder rezar por eles. Cada perigo serve para crucificar toda a minha vontade de não perdoar, de não amar, de não orar pelos teus carrascos.
Devo, quero pensar de estar perto do teu berço. Também naquela oportunidade rezava pelos homens. Mas lá era fácil. Tu estavas vivo e eu, porquanto julgasse cruéis os homens, nunca teria chegado a pensar que pudessem sê-lo Contigo, que os havia beneficiado acima do limite. Orava, convicta de que a tua Palavra os teria tornado bons. No meu coração dizia-lhes, fitando-os: ‘Sois maus, doentes, agora, irmãos. Mas daqui a pouco Ele falará, mas daqui a pouco Ele vencerá em vós o Satanás. Dar-vos-á a vida perdida!’ A vida perdida! Tu, Tu, Tu, a perdeste, a vida por eles. Jesus meu! Se quando estavas no berço, eu tivesse conseguido ver o horror deste dia, o meu doce leite teria se mudado em tóxico pela dor! Simeão o dissera: ‘Uma espada te transpassará o coração’. Uma espada? Uma multidão de espadas! Quantas feridas te fizeram, Filho? Quantos gemidos tiveste? Quantos espasmos? Quantas gotas de sangue verteste? Pois bem. Cada uma é uma espada para mim. Sou um emaranhado de espadas. Em Ti não tem um pedaço de pele que não seja chagado. Em mim não há um que não seja transfixado. Transpassaram-me as carnes e penetram-me coração a dentro.
Quando esperava o teu nascimento, preparava para ti as faixas e os linhos, fiando o linho mais mórbido da terra. Não olhei ao preço, para poder possuir os fios mais macios. Como eras lindo nas roupinhas de tua Mamãe! Todos me diziam: ‘É linda a Tua criancinha, Mulher!’ Eras lindo! Do alvor do linho emergia o réu róseo rostinho. Tinhas dois olhinhos mais azuis que o Céu, e a cabecinha parecia envolvida numa neblina de ouro, tanto os teus cabelinhos eram louros e mórbidos. Tinham o sabor da amendoeira ao desabrochar. Pensavam que eu te perfumasse. Não. O meu tesouro não tinha que o perfume das roupinhas lavadas pela Mamãe, esquentadas, beijadas pelo seu coração e pelos seus lábios. Nunca me cansava de trabalhar par Ti.
E agora? Não tenho mais nada para fazer por Ti. Há três anos estavas longe de casa. No entanto eras ainda a razão dos meus dias. Pensar em Ti. Nas tuas vestes. Na tua comida: misturar a farinha para fazer o pão, cuidar das abelhas para preparar-te o mel, tratar as árvores para que dessem os frutos. Como amavas as coisas que a tua Mãe te levava! Nenhuma comida de mesa abastada, nenhuma veste de fazenda preciosa tinha para Ti valor como estas tecidas, cosidas, cuidadas, colhidas pelas mãos de tua Mãe. Quando me chegava a Ti, tu me olhavas logo as mãos, como quando eras pequenino e eu e José dávamos modestos presentes para te fazer sentir que eras o nosso Rei. Nunca foste guloso, meu pequenino, mas eras o amor que tu procuravas, era esta a tua comida e nos nossos cuidados o encontravas. Agora também encontravas, procuravas aquilo, pobre Filho meu, tão pouco amado pelo mundo!
Agora mais nada. Tudo está acabado. Nada mais fará por Ti a tua Mãe. Não precisas mais de nada... Agora estás sozinho... E eu estou sozinha... Oh! Feliz José que não alcançou este dia. Oh! Se eu também não o tivesse alcançado! Mas se assim fosse Tu não terias experimentado nem sequer este conforto de ver a tua pobre Mãe. Terias ficado sozinho na cruz, como estás sozinho no sepulcro. Sozinho com as tuas feridas.
Oh! Deus! Deus, quantas feridas tem o Teu Filho, o meu Filho! Como consegui vê-las, sem morrer eu, que desfalecia quando tu, criancinha, te machucavas?! Mas eu, que me sentira morrer vendo gotejar o teu Sangue na circuncisão – e José teve que me sustentar porque tremia como um que está à morte – me parecia que aquela pequenina ferida te fosse fatal, e a curei mais com o pranto que com a água e o azeite, e não me acomodei senão quando o sangue cessou.
Uma outra vez aprendias a trabalhar e te feriste com o serrote. Não tive sossego senão quando, após seis dias, vi sarada a tua mão. E agora? E agora? Agora tens as mãos, os pés, o lado aberto, agora a tua carne cai aos pedaços, e tens o rosto contundido, aquele Rosto que eu não ousava tocar com o meu beijo, e chagada tens a testa e a nuca. E ninguém te deu remédio e conforto.
Olha para o meu coração, ó Deus, que me feriste na minha Criatura! Olha-o! Não está chagado como o Corpo do Filho meu e Teu? Os flagelos se abateram como granizo sobre Mim, enquanto estava sendo golpeado. Que é a distancia para o amor? Eu sofri as torturas de meu Filho! Antes eu as tivesse sofrido sozinha! Antes estivesse eu sobre a pedra sepulcral! Olha para mim, ó Deus! Não goteja sangue o meu coração? Eis a marca dos espinhos. Sinto-a. é um laço que me aperta o coração e o perfura; eis o buraco dos pregos: três estiletes fincados no coração.
Oh! Aqueles golpes! Aqueles golpes! Como não desabou o céu por aqueles golpes sacrílegos nas carnes de Deus? E não poder gritar! Não poder gritar! Não poder me lançar para arrancar a ama aos assassinos e fazer da mesma uma defesa para a minha Criatura moribunda! Mas se obrigada a ouvi-los, ouvi-los e não poder fazer nada! Uma pancada sobre o prego, e o prego entrava nas carnes vivas. Uma outra pancada, e entra mais ainda. Uma outra e uma outra e se despedaçam os ossos e os nervos e é transpassada a carne do meu Menino e o coração de sua Mãe.
E quando te levantaram sobre a Cruz? Quanto deves ter sofrido, Filho Santo! Vejo ainda lacerar-se a tua mão nos solavancos do infixamento. Tenho o coração lacerado igual a ela. Estou contundida, lacerada, flagelada, pungida, ferida, transpassada como Tu. Não estava contigo sobre a cruz. Mas olha-a, a tua Mãe! Está diferente de Ti? Não. Não há diferença de martírio. Aliás o Teu acabou. O meu dura ainda. Tu não ouves mais as acusações falsas: eu as ouço. Tu não ouves mais as blasfêmias horrendas. Eu as ouço ainda. Tu não sentes mais a mordedura dos espinhos e dos pregos, e a sede e a febre. Eu estou repleta de pontas de fogo e sou como quem morre de ardências e de delírio.
Ao menos me tivessem deixado te oferecer uma só gota de água! O meu pranto, quando a ferócia dos homens se negava a dar ao Criador a água por Ele criada. Dei-te tanto leite, porque éramos pobres, Filho meu, e na fuga para o Egito tínhamos perdido quase tudo, e tivemos que rezafer um teto, uns móveis e vestes e comida, e nem sabíamos quando o desterro teria durado, e nem quando teríamos achado voltando ao Lar. Amamentei-te além do tempo costumeiro para que Tu não sentisse falta de alimento. Até que não conseguimos uma cabrita, a tua cabrita fui eu, menino da tua Mãezinha. Tu já possuías tantos dentinhos e mordidas... Oh! Alegria em te ver contente nas brincadeiras infantis! Tu querias caminhar. Eras tão sadio e forte. Eu te sustentava por hora e horas e não sentia qualquer cansaço em ficar curvada sobre Ti que fazias os teus passinhos, e dizias a cada passo: ‘Mamãe! Mamãe!’ Oh! Felicidade ao ouvir cantar aquele nome!
Hoje também o dizias: ‘Mamãe, Mamãe!’ Mas a tua Mãe não podia senão verte morrer. Nem sequer podia te acariciar os pés! Os pés? Oh! Não teria tido ânimo de tocá-los, também se estivessem ao alcance da minha mão, para não aumentar o tormento. Como deviam sofrer os teus pobres pés, ó meu Jesus! Tivesse conseguido subir na cruz e colocar-me entre o madeiro e o Teu Corpo, e impedir que nas convulsões e agonia Tu batesse contra o lenho! Sinto-a ainda, a tua Cabeça batendo na cruz nos últimos estremecimentos. E aquele barulho, aquele barulho me enlouquece. Guardo-o na cabeça como um martelo.
Volta, volta, Filho querido, Filho Santo! Eu morro. Eu não suporto esta minha desolação. Mostra-me novamente o teu rosto. Chama-me ainda. Eu não posso te imaginar sem voz, sem olhar, reduzido a despojos frios e sem vida! Oh! Pai, socorre-me Tu. Jesus não me ouve! Não acabou a Paixão? Não está tudo completado? Não bastam estes pregos, estes espinhos, este sangue, este pranto? Algo mais ainda é preciso para salvar o homem?
Pai, estou te elencando os instrumentos da sua dor e o meu pranto. Mas isto é o menos. Aquilo que o fez morrer angustiado sobrehumanamente foi o Teu abandono. Aquilo que me arranca um grito do meu coração é o Teu abandono. Não te sinto mais. Onde estás, Pai Santo? Eu era a ‘Cheia de Graça’. O Anjo o disse: ‘Ave Maria, Cheia de Graça, o Senhor é contigo e Tu és bendita entre todas as mulheres’. Não. Não é verdade! Eu sou como uma maldita por Ti pelo seu pecado. Tu não estás mais comigo. A Graça se retirou, como se eu fosse uma segunda Eva pecadora. Mas eu sempre te fui fiel. Em que te desagradei? Fizeste os anjos mentir? E Ana, que me assegurou que Tu me darias o teu anjo na hora da dor? Estou sozinha. Não encontro mais Graça aos teus olhos; não te possuo mais, Graça, em mim. Não possuo mais o Anjo. Mentem, pois os Santos? Em que te contristei, se eles mentem e eu mereci esta hora?
E Jesus? Em que falhou o teu Cordeiro puro e manso? Em que te ofendemos para que, além do martírio dado pelos homens, tenhamos que experimentar a tortura incalculável do teu abandono! Mas Ele, Ele que te era Filho e que te chamava com aquela voz que fez estremecer a Terra e se sacudir num soluço de compaixão! Como tem foi possível deixá-lo sozinho em tanto tormento?
Pobre Coração de Jesus, que te amava tanto! Onde está o sinal da ferida do coração? Ei-lo. Olha, Pai, para este sinal. Aqui está a marca da minha mão, penetrada no sulco aberto pela lança. Aqui... Aqui... Não o cancelam o pranto e nem o beijo da Mãe, que tem os olhos ardendo e os lábios consumidos pelo chorar e pelo beijar. Este sinal grita e admoesta. Este sinal grita a Ti da Terra mais do que o sangue de Abel, e Tu, que maldisseste a Caim e o vingaste, não interviste em favor do meu Abel, já dessangrado pelos seus Cains, e permitiste o último ultraje! Tu lhe esmagaste o coração com o Teu abandono e deixaste que um homem o desnudasse para que eu visse e fosse esmagada. Mas para mim nada exijo. É para Ele, para Ele que te peço e te intimo a responder. Não devias...
Não devias... Oh! Perdão, Pai! Perdão, Pai Santo! Perdoa a u’a Mãe que chora a sua Criatura... Está morto! Está morto o Filho meu! Morto com o coração dilacerado. Oh! Pai, pai, piedade! Eu te amo! Nós sempre te amamos e Tu tantos nos amastes. Como permitiste que fosse ferido o Coração do nosso Filho? Oh! Pai!... Piedade de uma pobre mulher. Eu estou delirando. Pai. Eu sou Tua, teu nada, e tenho a ousadia de te repreender! Piedade! Foste bom. A ferida, a única ferida que não fez mal, é esta.
O teu abandono serviu para fazê-lo morrer antes do fim do dia, para evitar-lhe outras torturas. Foste bondoso. Tudo tu fazes visando beneficiar. Somos nós criaturas, que não compreendemos. Foste bondoso. Bondoso Tu foste! Pronuncia, sempre te amou, ó minha alma. Do berço até agora, sempre te amou. Deu-te todo o gozo do tempo. Todo. Deu-te a Si próprio. Foi bom, bom, bom. Obrigada, Senhor, que Tu sejas bendito pela Tua infinita bondade.
Obrigada, Jesus: agradeço também a Ti! Eu somente a senti no meu, quando vi o teu Coração aberto. Agora está no meu coração a Tua lança, e remexe e estraçalha. Mas é melhor assim. Tu não a sentes mais.
Mas Jesus, piedade! Um sinal de Ti! Uma carícia, uma palavra para a Tua pobre Mamãe, que tem o coração despedaçado! Um sinal, um sinal, Jesus, se queres achar viva quando voltares.
Notas:
[i] 11º Capítulo do livro, às páginas 119-124. Imagens do filme “A Paixão de Cristo”, (The Passion of the Christ). Drama bíblico. EUA/ITA: 2004. Direção: Mel Gibson. Organização do Prof. Dário Benedito Rodrigues (Bragança/PA).
[ii] Tradução de uma parte da obra italiana intitulada “O Poema do Homem-Deus” (Casa Editora Emilio Pisani, de Isola del Liri, Itália), que corresponde aos últimos 19 capítulos do nono aos primeiros 6 capítulos do décimo volume. A obra completa encontra-se em 10 volumes conhecidos como “O Evangelho como me foi revelado”. O Papa Pio XII a leu e em audiência privada em 26 de fevereiro de 1948 autorizou a sua publicação. Os escritos de Valtorta passaram por diversas controvérsias, incluindo uma possível colocação no Índex da Igreja Católica. Esta tradução foi feita pelo ainda Monsenhor Miguel Maria Giambelli CRSP (1920-2010), já Administrador Apostólico da Prelazia do Guamá, e apresentada em 23 de março de 1978, numa Quinta-feira Santa. Teve o Imprimatur redigido por Dom Alberto Gaudêncio Ramos, Arcebispo Metropolitano de Belém, em março de 1978. Um texto de apresentação nas folhas de capa do livro, escrito por Dom Eliseu Maria Coroli CRSP (1900-1982) incentiva a leitura do poema. O texto foi atribuído a revelações privadas, visões e ditados do próprio Deus que a autora teve durante sua vida. A obra foi composta a partir de 1943 até 1951, em 15 mil páginas manuscritas em 122 cadernos, que depois foram datilografadas e que circularam na Itália até sua primeira edição.
[iii] Maria Valtorta nasceu em Caserta, na região da Campânia, Itália, em 14 de março de 1897. Tendo completado seus estudos, tornou-se enfermeira samaritana e serviu durante a Primeira Guerra Mundial num hospital de feridos de guerra, em Florença, na Itália. Neste lugar, em 17 de março de 1920, aos 23 anos, enquanto andava pela rua, foi violentamente golpeada nas costas, à altura dos rins, com uma barra de ferro, por um delinquente, o que lhe provocou a paralisia nos membros inferiores e constantes dores que a acompanharam até o fim da vida, permanecendo acamada desde 1934. Faleceu em 12 de outubro de 1961. Foi considerada, por um filósofo, teólogo e renomado mariologista, Padre Gabriel M. Roschini, professor da Universidade Pontifical Laterana de Roma, como umas mais dezoito maiores místicas de todos os tempos.
[iv] Nota do Tradutor: Trinta e quatro anos, não porque Jesus tenha vivido 34 anos, mas porque Maria vos acrescenta os 9 meses da gestação.