quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

E a nossa cultura em 2009?

Encerrou-se 2009. E com ele um fim de ano cheio de muitos solavancos.
Cabe-nos refletir de forma retrospectiva sobre o que se fez por nossa cultura histórica, patrimonial e arquitetônica em desmonte durante todo esse ano que ora termina. Esperava-se mais muito mais dos gestores estaduais e municipais, assim como dos orçamentos para com a cultura e patrimônio histórico de Bragança, pelo meio aonde circulei e por todos se dizerem incontestavelmente pessoas de sensibilidade cultural e muito mais ainda responsáveis pela cultura oficial bragantina. As nossas festas populares tiveram um melhor aspecto, na medida que trouxeram de volta a recuperação da memória popular bragantina, como o Carnaval (da Nega do Time Negra e Dona Aspázia), mas pecam ainda por não ter uma identidade temática, que vá além da programação, ornamentação e publicidade ao cerne da questão cultural, que é educativa, sobremaneira. No mais, um projeto feliz foi o lançamento do cd de Júnior Soares com as cantigas e folias das comitivas de esmolação de São Benedito (praias, campos e colônias), finalizado com o magnífico "Hino a São Benedito", que ficou lindíssimo. Outro, os pontos de cultura estão aí. O Grêmio Musical Nazeazeno Ferreira e a Irmandade da Marujada de São Benedito foram conquistas importantes. E isso devemos comemorar. O que dizer então da restauração completa da imagem de São Benedito? Ficou primoroso! Lamento por algumas obras que se divulgaram sérias e tão inéditas serem publicadas e não corrigirem, mesmo em errata post scriptum, problemas sérios quanto à técnica da escrita da história, dados e fontes históricas.
A reforma da Casa da Cultura, prédio do município, nada ainda, só projeto, pelo menos. É difícil, eu sei, eu entendo, eu aceito as dificuldades, mas a situação é lamentável. E ficou só nisso, infelizmente. O prédio da prefeitura foi fechado em 31 de março de 2009, e o acervo do arquivo documental se acabando nos depósitos, sendo devorado pela traça, pelo traslado de lá pra cá e até mesmo pelo descaso.
Desde 08 de fevereiro, a primeira parte da Praça de Eventos Armando Bordallo da Silva foi concluída. E todos podem achar agora que a obra está completa, mesmo ainda não retomada. O povo bragantino parece se acostumar com isso.
Em algumas oportunidades, a memória da cidade foi jogada ao relento, como a Escola Monsenhor Mâncio Ribeiro, que pode não restar peça em madeira alguma para refazer aquilo que se perdeu, apesar dos justos e silenciosos protestos dos alunos da querida escola, que jaz num prédio igualmente aos pedaços no bairro do Riozinho.
Apesar de todos os esforços desse governo municipal, os prédios incluídos nos decretos de tombamento de patrimônio histórico de Bragança, que poderiam ser mais respeitados, não o foram por completo. Nenhuma providência séria foi tomada contra a continuação da dilapidação gradativa da casa da família de Raymundo Nazeazeno Ferreira, não por falta de orientação, de trabalho educativo, de legislação específica e fiscalização por parte da prefeitura, mas por punição mesmo.
Em Bragança, não se criou ainda uma política cultural participativa, mas sim uma “cultura política”. Todos devem participar! Eu percebo que não foi ainda sequer cumpridos pontos fundamentais para o registro da cultura, como o Plano Diretor nessa área. Os artistas e as entidades culturais foram chamados, alguns foram ouvidos, outros nem fizeram questão de participar, lamentavelmente. Mas nada de gestão democrática... ainda. Aguardamos para ver em 2010, ano de eleições...
O fundo municipal de cultura não existe de fato, só de retórica e suposição, para que os artistas e grupos pudessem ter seus projetos financiados, sem precisar mendigar de pires na mão e sem apadrinhamentos políticos. As promessas de construir, de reformar, de criar um arquivo público municipal, entre tantas outras foram apenas promessas que não saíram do papel, mesmo com a insistência de tantos setores do próprio governo, como o que eu fiz parte. E ainda, não se pode falar muita coisa, para não causar melindres em alguns. O prédio identitário que foi a residência de José Paulino dos Santos Mártyres e depois sede da ACREB e da Fundação Cultural Bragantina tem uma memória, mas pode virar Casa da Juventude. Nada contra a juventude, de forma alguma, mas tudo em favor da história que aquelas paredes abrigaram. Nenhum programa inovador, no sentido de sua consistência, se teve para servir a uma cidade de tradição cultural. Alguns destaques vieram à tona. Infelizmente a cada tempo que passa parece que as coisas tem piorado... e quem vem salvando a cultura de Bragança são justamente os grupos e artistas que divulgam o nome de nossa terra e realizam coisas brilhantes em favor da nossa arte e da nossa gente. Exemplo disso são as gincanas culturais (algumas delas religiosas e escolares), que demonstram certo nível de discussão cultural sobre Bragança. Nenhuma obra literária de peso foi publicada como acervo documental ou cartilha para auxiliar os/as nossos/as professores/as.
Graças a uma iniciativa do governo federal, a 1ª Conferência Municipal de Cultura de Bragança foi realizada, sem uma participação tão grande, já que muitos grupos e entidades não acreditam nessa estratégia de controle social e de definição de políticas. Veremos se as metas e proposições aprovadas serão ao menos indicadas no Orçamento.
A Semana da Pátria foi bacana. O aniversário da cidade, nem tanto. Virou festa política. O Mirante de São Benedito quase não ficou pronto, pelas chuvas. Mas bem que a imagem poderia ficar um tantinho mais bem feita. O Festival de Música da Associação Cultura Musical Bragantina foi de excelente nível, mas parte da população ainda não gosta e nem está habituada à boa música. Infelizmente!
Os sites de Bragança deram um show à parte. Cobriram indistintamente vários eventos sociais e culturais e por isso merecem uma menção respeitosa e que se congratule com as pessoas que os coordenam, sem disputas nem predileções, mas felicitações. Mas uma coisa é de suma importância. Bragança terá, se Deus quiser e São Benedito der aquela força, o melhor PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) das Cidades Históricas, elaborado por outra secretaria, em boa hora, para dar uma organização, uma oxigenada e apontar um rumo. Talvez este seja um projeto que sabe dialogar com a memória da cidade, com as pessoas, com os que pensam a cultura e a história, além de estar aberto para recuperar Bragança, ouvindo sugestões e críticas diagnósticas. Desejo que o PAC Cidades Históricas possa ser realizado totalmente para enfrentar os desafios de gerir uma cidade tão grande, complexa e culturalmente privilegiada como Bragança. Se ele conseguir desmanchar o clima de politicagem e de partidarismo, que tomou conta de vários órgãos e fizer um terço do que se propõe, terá cumprido uma missão importante e será aplaudido. O Curso de História (regular) da UFPA é uma conquista real, que vai ajudar a pensar a cultura e melhorar as pesquisas sobre História local. Isso é fato!
De forma alguma estou afirmando verdades incontestáveis, apenas expondo meus pontos de vista. Quiçá possam servir a muitos para a reflexão e tomada de atitude, pois o que a cultura de Bragança precisa em 2010 é de atitude. Como a de ser, plenamente, uma política pública, com status de secretaria própria e com recursos para gerenciar e realizar.
Atitude, por exemplo, para coibir a cultura da exorbitância dos volumes em carros-som que passam das sete às sete, sem respeitar o povo, escolas, igrejas, templos, ou de ter a liberdade de denunciar isso e saber que os veremos sentir o peso da lei. Quem dera!
E ainda, tem cara na mídia (?) que deveria apurar melhor os fatos e não apenas repetir mentiras, fofocas ou boatos, ainda mais quando usa de coisas de ordem pessoal para tentar atacar pessoas por aí, sem ouvi-las e ainda dar de ombros e/ou fingir depois que nada aconteceu. Ou ainda dos que se dizem amar Bragança, defendê-la, divulgá-la, mas usam a cultura bragantina agora como seu palco pessoal. Não queremos mais esse tipo de cultura fechada em micro círculos, mas ampla, irrestrita, do povo, sem deixar de ter bom senso, gosto, cheiro e cor do povo bragantino.
Esse pensamento não faz parte da natureza cultural do povo bragantino e por respeito não o comentarei nem o utilizarei em nenhum outro argumento. Por isso posso dizer com tranquilidade que sou apenas uma voz, não a voz. Quero ser apenas mais um responsável e mais um a se comprometer, mesmo agora no âmbito federal, com a história da minha cidade. Não precisei de "jeitinho" nem de "empurrãozinho". E estou dando, assim como muitos, atenção redobrada e contribuição honesta à história da minha querida Bragança, já que meu cordão umbilical está aqui. Não esqueço disso.
E como diria um amigo meu, de longe e de longas datas, "vermes não fazem história, apenas são pisoteados por ela". Depois, quem sabe, eu conte o resto.

Um comentário:

  1. Parabéns Dário, pois você de forma inconteste sabe reconhecer o potencial que temos e, também, denuncia de forma tão proficiente, elegante e erudita todas as mazelas que ainda nos afligem. Lute! Continue acreditando no futuro desta terra, assim como você defende o passado dela. Estaremos aqui, unidos pelo esforço de fazer o possível para que nossos sonhos de bragantinidade se concretizem e que finde todo esse pesadelo.

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